Montanha-russa Brasil: da subida para a recuperação à surpresa da queda: parte 2

Por Edmar Bulla

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Os mercados já registram alta na demanda, resultado de consumidores que estão estocando alimentos não perecíveis, além de itens de higiene e limpeza, de maneira inconsequente e irresponsável. Algumas dessas categorias cresceram 20 a 35% nos últimos dias, segundo ouvi de alguns profissionais do setor. 

 

No final de semana anterior, a APAS mapeou o aumento de 18% nas vendas em relação ao mesmo período do mês passado, chegando a picos de até 80% em algumas lojas. Em farmácias, o aumento médio chegou a 30%. A ruptura aumenta, as vendas on-line crescem vertiginosamente (em alguns casos, até 10 vezes mais), a capacidade de armazenagem e reposição estruturadas em modelos tradicionais não se adequam. Alguns varejistas já testam mudanças no sistema para atender diretamente do Centro de Distribuição. 

 

E por que isto acontece? Um pico exagerado de demanda concentrada, irracional e motivada pelo medo. Como resultado, os varejistas começam a implantar mudanças que podem afetar ainda mais uma população endividada e aterrorizada pela pandemia: suspensão de ofertas, revisão de formas de entrega e atendimento domiciliar e redução de estoque curvas B e C para aumentar curva A, entre outros.

 

Qual deve ser, portanto, o papel do varejo e quais são as oportunidades, incluindo éticas e sociais, que surgem neste momento de tantas incertezas? Chegou a hora da multicanalidade despertar para seu pleno potencial, enfrentando a cobrança pela eficiência de formatos já usados e a demanda por novos formatos de entrega.

 

Neste momento, o varejo deve:

 

  • Orientar consumidores com conteúdos informativos, tanto em lojas quanto em redes sociais.
  • Comunicar ostensivamente novos hábitos a serem adotados na compra.
  • Comunicar claramente aos clientes eventuais mudanças na operação.
  • Educar também sobre abastecimento e evitar compras desnecessárias e desperdício.
  • Não permitir comunicação ou alteração de preço oportunista.
  • Criar ações para coibir a compra por especulação.
  • Gerir o aumento das vendas e impor restrições na compra de volume por SKU nas lojas.
  • Instruir caixas e atendimentos presenciais e muni-los de mecanismos de proteção.
  • Aprimorar manutenção e limpeza criteriosa das lojas, priorizando o cuidado com funcionários.
  • Substituir negociações comerciais presenciais por soluções remotas.
  • Estabelecer horários específicos para atendimento dos mais idosos.
  • Trazer mais opções de pagamento e linhas de crédito.
  • Inovar em plataformas digitais de compra.
  • Para pequenos varejistas, pedidos a fornecedores devem ser gerenciados e, talvez, reduzidos.
 

Em um segundo momento, com o aumento exponencial dos casos de infecção:

 

  • Evitar ruptura e promover rápida reposição de itens principais, eliminando a falsa percepção de escassez.
  • Coibir o aumento de tabelas da indústria.
  • Gerenciar os impactos negativos em transporte e turismo.
  • Garantir operações de e-commerce, atendimento remoto, self check out e compras programadas.
 

Na preparação para a quarentena, com o aumento das compras on-line, dos serviços de entrega e provável impacto na cadeia de abastecimento, as recomendações são:

 

  • Reprogramar horários de funcionamento e até avaliar se vale a pena operar todos os dias.
  • Manter o equilíbrio de preços.
  • Suportar o aumento do delivery e demanda intensa do e-commerce.
  • Desenvolver soluções criativas para entrega e consumo de itens frescos.
  • Provisionar alimentos e bebidas associadas ao fortalecimento do sistema imunológico, além de sorvetes e comfort food.
  • Gerenciar a queda de consumo de itens considerados menos ou não necessários, como confeitos e beleza.
  • Criar e promover parcerias com a indústria, restaurantes, bares, lanchonetes e até pequenos varejos, beneficiando toda a cadeia e a sociedade, seja para abastecer famílias com potencial de consumo ou para amparar aqueles que perderam sua renda. Como medida para evitar a escassez, varejistas podem comprar ingredientes de restaurantes fechados, por exemplo.
 

Já na quarentena:

 

  • Gerenciar preços será ainda mais fundamental.
  • Oferecer descontos e ofertas especiais para clientes dispostos a postergar a compra.
  • Manter quantidades limitadas em produtos com mais alta demanda.
  • Garantir e priorizar serviços de entrega domiciliar, que assumem um papel extremamente importante. Pontos físicos de venda representarão ainda mais o seu papel de entreposto logístico.
  • Usar a tecnologia e suas ferramentas como aliadas. Por exemplo, atendimento on-line e delivery serão recursos-chave para atender a população que evita ou não pode sair de casa.
  • Inovar em alimentos e bebidas prontos para consumo.
 

Cuidados com a saúde e alimentos e bebidas seguirão aquecidos até o final da quarentena, quando conheceremos os sobreviventes da crise. Turnos operacionais e rotina se restabelecerão e haverá demanda reprimida, especialmente em setores como alimentação e entretenimento fora de casa, viagens e turismo. Bens duráveis devem ter recuperação mais lenta.

 

Fato certeiro é que devemos estar preparados para reconhecer um novo consumidor pós-COVID-19, talvez mais humano, mais comedido e mais solidário, com hábitos alterados. Fiquem atentos às possibilidades que este momento traz para o seu negócio e busquem formas para se reinventar. Há grandes oportunidades de calibragem do nosso trabalho e do funcionamento do planeta, como promover consumo mais consciente, combater o desperdício, desenvolver novas rotas de fornecimento e aprimorar os mecanismos de gerenciamento de estoques e da gestão da cadeia de suprimentos.

 

O segredo para chegar sem dores e maiores danos ao final dessa grande montanha-russa trepidante de madeira é não gerar tensão desnecessária e evitar ao máximo a rigidez. Flexibilidade e jogo de cintura são fundamentais, porque a velocidade de recuperação econômica ainda é incerta. Façamos desta experiência um aprendizado positivo ao qual chegaremos, ao final, muito mais fortes.

 

Desejo saúde, reprogramação de hábitos e reaprendizado positivo.


 

Publicado originalmente no LinkedIn:

 

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